quinta-feira, 7 de março de 2013

e se as minhas mãos de repente arderem quando te beijar,
se vires as paredes definhar nas ruas do meu corpo
.não fales.
a imensidão foi sempre um sonho meu,
horizontes de vidros baços e lagos de lama
carros que ficam estacionados a vida inteira na avenida,
um nada-a-perder que escorre dos lábios
e uma cama feita de asas de borboleta.

deixa-me ser todas as coisas do mundo.
.não fales.
digamos que a vida não é suficiente para ti,
atiras o cabelo para trás
como quem apaga um cigarro
no cinzeiro de ninguém
e no interior das tuas mãos
mora um corpo translúdido

guardas religiosamente
o vestido do casamento das almas
no quarto do fundo do corredor
depois da madeira envernizada
das escadas
o corrimão de ferro gasto
a estupidez da natureza morta
[na parede, nas paredes]
um lápis esquecido
junto ao rodapé.
de paris, de copenhaga, de dublin
a poesia chega igual
[um grafismo desconhecido,
quase fonético]
não percebes muito bem
o sentimento da chuva
na janela suja do escritório,
assim, uma brutalidade
quase naive que roubas
da montra de uma livraria qualquer.

digamos que em ti quase tudo é indiferença
o cheiro a mortos no pátio da vizinha,
a moldura caída há dois anos na estante,
os livros rasgados nos cantos,
a tabacaria do pessoa
(indiferente, indiferente...)
mas um sorriso pode destruir
qualquer realidade.

a escassa melancolia do sangue

fumo demais.
não confio em quem fuma demais.

e sei que o amor vive nos olhos
de um desconhecido
que coleciona caixas de chiclets
que apanha no jardim
que vive nas nossas cabeças.

e tudo é um (q)u(e) imenso

i think you would like to know
an angel.

cansa-me
a explosão atmosférica
presa entre os dedos.
as feéricas hélices da tua boca
cansam-me.

é verdade que o luar
me fodeu a estratégia
de coser o teu corpo
à memória.
[confesso]
mas as horas
queimam-me o pulso
com a mesma intensidade
da obscena loucura
de mutilar a alma.

"os teus olhos continuam aqui"

não confio em pessoas
que cultivam a solidão
em estufas de vidro baço.