quarta-feira, 4 de julho de 2007

old one



Chama-me mesmo que o passado não o permita,
vamos esvaziar todas as caixas e fingir que nos amámos um dia.
Vê como cresci!
Vê como são leves as minhas mãos vazias do teu corpo.
Aprendi a ser lúcida ás vezes,
a contar histórias aos filhos que nao tivémos,
a amanhecer em todos os rostos,
a prolongar a dor só para não estar sozinha.
Depois foi chegar ao inverno de todas as coisas,
pintar a casa e imaginar o teu funeral.

Meu amor:
As árvores cresceram tão depressa que da janela já não se vê o mar,
as crianças são agora homens, a saliva não tem qualquer sabor
e a pele que tão bem conheceste é uma ferida aberta, cansada e velha.
A cama continua desfeita e as tuas vagabundas palavras
nunca viveram para além da garganta. Alguém há-de contar-te o que
não sabes de mim, eu não sinto saudade de nada, não te conheci, não te amei
nem tão pouco fui capaz de dizer-te adeus. Faltou tanto e restou tão pouco
do que dizias pertencer-nos. Já não tenho medo dos pequenos papéis colados
aos móveis. Vê como cresci... Aprendi a viver a tua ausência tão intensamente
que já não me lembro do teu rosto...

Chama-me e conta-me mentiras como se não conhecesse já todos os teus olhares,
não sei se deva dizer-te que respiras como antigamente e por isso pouco mudou.
Ontem decidi vender todas as noites que passámos ao relento mas quem quereria
comprar o meu passado? Mas vê meu amor, vê como cresci!
Agora morro à velocidade do grito.


cláudia ferreira

1 comentário:

C-ASA disse...

"Agora morro á velocidade do grito"

belo, belo, belo...