Prometi escrever-te.
O dia amanheceu claro, apesar do Outono, e tu foste a
primeira memória quando, ainda dormente senti a fragilidade da manhã. Foste tu, que me abriste os olhos
com os teus lábios.
Fumo um cigarro enquanto te vestes. Olho-te e não posso
querer mais nada para além deste momento perfeito em que te vestes. E és só tu
e as tuas roupas, despenteado e preguiçoso.
Vais passear o cão, levar o lixo, roubar-me a alma, não
percebi bem o que disseste. Vi apenas os teus lábios moverem-se na minha
direcção.
Imagino tudo. Tu, a afastares-te devagar, as tuas costas onde
deposito os meus fracassos. O peso que carregas, o da minha existência, do meu
não poder. Tudo o que eu não quero.
Quando voltares eu já desapareci, não vais lembrar-te de
mim. Restarão apenas algumas sensações que não saberás decifrar e esta página
escrita. Vais pensar que a retiraste de um livro sem valor qualquer que leste
há muitos anos.
A vida vai continuar, a tua casa, os teus filhos a brincar
em jardins imaginários, outro corpo na cama a abraçar-te. A dar-te tudo o que
não posso.
Mas não existe mais nada, só este momento perfeito em que te
vestes e eu me apago sem dizer nada. E eu me dissolvo no desejo de ti.
Sem comentários:
Enviar um comentário