as canetas delicadamente arrumadas
quando já não souber escrever
ou os frutos intactos na mesa de jantar
talvez a planta morta na janela da sala
uma música que reconheço por não a teres cantado.
diz-me, o que vai sobrar de nós?
continuaremos a ser de carne e osso
e músculo e ferida
seremos ainda compostos de tempestade
terei um cão para passear nos dias cinzentos
ou irei apenas ver passar carros na avenida
para não te perder.
3 comentários:
É sempre tão notório a influência de Al Berto na tua escrita. E isso agrada-me, bastante.
O favorito. :)
Cruel tempo de copiosos ventos e seus lamentos.
De esquivos animais e seus ais.
Quantas folhas escreverão minha jubilação
diante deste rigor, enlevado pela devastadora essência?
Que sangram a branca casa e sua destreza
para ecoar as vozes que transpõem o sono
e nos habitam como a certeza de sua derrocada?
Serão estas mãos de alguém, se já me devora
a penumbra e pela alva tudo renasce?
Recordarás estas longas horas quando despertar
uma idade tão sofrível quanto tuas pernas.
Mas consente ainda que a ilusão nos carregue,
que estas quedas, cujo desfecho adivinho,
nos enlacem como teus olhos ao desespero.
Amanhã voltaremos a calcorrear lugarejos
impensáveis, a acenar às laicas criaturas
a cada esquina remendando o alheio,
convencidas do seu triste labor;
ou, se desejares, buscaremos motivo outro
onde extenuar o coração e suas trémulas
promessas, construindo grades em volta.
Serás a treva e o que não vejo, apontando-me
uma fuga, furtiva que seja, e retirar-me-ei
como quem espera o destino ou um silêncio
último para o amor. Há muito me habituei
ao tique-taque do relógio e a este caderno incessantemente aberto.
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