quinta-feira, 4 de agosto de 2016

diafragma

se conseguirmos esperar que o último comboio
atravesse, sem medo, as calhas gélidas de metal
se aguentarmos o ruído cortante do último comboio
a rasgar a quietude das estações

teremos ainda uma hipótese de sobreviver

um dia, foi o meu cabelo a esvoaçar
do lado de fora da janela do último comboio
e tu, num riso infantil, dizias que só ama quem
é livre

tu disseste que se conseguíssemos esperar
até ao último comboio, tínhamos uma hipótese
de contrair o corte súbito na garganta
não nos esvairíamos em sangue na mais larga
avenida

eu sou livre
eu espero
o último comboio
o único corte
o sangue de quem ama
a gélida estação
eu sangro do lado de fora
da janela.


2 comentários:

Anónimo disse...

Tão bom, tão tenso e intenso, tão genuíno. Já sou visita diária.

nocturnidade disse...

sente-te em casa :)