terça-feira, 9 de agosto de 2016

rescaldo

tinhas razão.

acordamos no meio do incêndio
a garganta arranhada e o sabor a sangue
na boca.
as janelas pejadas de pequenos pedaços
de cinza branca por dissolver

todas as serras arderam em redor da cidade
não teremos mais sombra nem cheiro
a eucalipto.
nenhum motivo para contemplar
a alegria e voo aflitivo dos pássaros

tinhas razão quando dizias
que nada nos restará
e eu acreditei, no momento
em que fechaste a porta
que isso era só mais uma frase
para me magoar

mas tinhas razão.
nada nos restará, nem este dia
que depressa escorregará
pelos olhos do infinito.

devia ter olhado fundo nos teus olhos
ter percebido que era verdade
quem sabe abraçar-te.
colocar-me no ínfimo espaço
entre o teu peito e a faca
e não deixar sair da tua boca
as palavras mais cruéis desse dia.

veremos tudo morrer antes de nós
teremos tudo a arder nas nossas mãos.

e nada te restará meu amor
só a razão.


Sem comentários: